Algumas percepções e reflexões iniciais que tenho tido neste primeiro mês que resolvi arriscar o desafio de lecionar filosofia para o primeiro ano do ensino médio, jovens de idade entre 15 e 16 anos.
Os jovens são interessados e curiosos
Diferente do que pode se pensar ou do que muitos dizem, percebi que os jovens são interessados e curiosos, com vontade de conhecer e aprender. Isso não quer dizer que eles querem aprender o conteúdo tal como os professores sabem, no tempo que os professores pretendem transmitir ou na ordem da programação das aulas, mas buscam o que se interessam prioritariamente para os assuntos que estão em voga no momento e questões da vida que envolvem o período da adolescência, tais como: identidade, verdade, justiça, valores, costumes, crenças.
Jovens gostam de participar e de se expressar
Os estudantes gostam muito de participar e se expressar o que pensam sobre as coisas e o que acreditam, se sentem valorizados quando reconhecemos o que eles dizem e o que eles pensam a respeito do assunto. Inclusive, na maioria das vezes, o que eles pensam tem muito sentido com o que realmente é, mas com a necessidade de se aprofundar um pouco mais nos assuntos. Mesmo quando pareça não ter sentido, é importante valorizar e apontar as diferenças entre o que pensam e o que é, nunca negando sua forma de pensar ou suas crenças, mas apontando a possibilidade de outras formas de pensar.
Necessidade de apresentar referências
Parece-me que os jovens carecem de referências mais “apuradas” e “acadêmicas”, não no sentido elitizado da palavra, mas no sentido de que não seja o “senso-comum” ou os valores de uma “cultura de massa”. As referências que eles possuem geralmente são bem taxativas, limitadas, incoerentes e pouco elaboradas. Percebendo isso, verifica-se a necessidade do acesso a um conhecimento mais amplo.
O autoritarismo não é positivo
A relação de respeito em sala de aula deve ser uma construção diária e constante, reconhecendo a agitação do jovem e sua necessidade de se comunicar, se expressar, brincar, se mostrar, ser reconhecido como um ser único, com identidade própria. Porém não se deve permitir que isso perturbe ou atrapalhe o andamento da atividade educativa, ao mesmo tempo que a melhor saída não é o uso da autoridade, mas a criação de uma relação de respeito, respeitando seu modo de ser e solicitando respeito para a atividade educativa. O autoritarismo distancia a relação entre educador e educando.
Construção do respeito e da liberdade
Os jovens estudantes estão acostumados culturalmente com o modo de ser da maioria dos professores que brigam e ameaçam os que conversam em sala ou tumultuam a aula, tentando ensinar a eles por meio da repressão, ou pela exigência de um comportamento dito “descente”. Quando se trata de maneira libertária, o jovem inicialmente sente-se libertado e quer usar e abusar de sua liberdade, isso é o começo do processo da anulação do autoritarismo na prática educativa. Depois disso a relação respeitosa deve ser mútua, de ambos os lados, sendo construída na prática e no contato, dia-a-dia.
Recursos didáticos
Para tornar a atividade mais didática, é importante se utilizar de recursos diferenciados que não seja somente a falação e a anotação de conteúdos na lousa. É importante se utilizar de desenhos, fotos, mapas, livros; enfim, materiais diversificados, para se gerar mais interesse dos jovens pelos conteúdos. A atividade educativa deve ser algo prazeroso e o educador deve proporcionar mecanismos de incentivo à curiosidade e despertar o interesse nos estudantes, inclusive som, vídeos, livros, pesquisas, etc.
Atividades individuais e coletivas
É muito grande a importância das atividades individuais, onde cada estudante reflita consigo mesmo o que sabe de um assunto ou o que entendeu de uma matéria específica. Tão importante quanto é a atividade em grupo, que enriquece e amplia o conhecimento de todos, de modo que eles trocam informações cada um transmite sua interpretação particular e cada um sai com uma visão mais ampla somando a dos colegas. Desta maneira é muito positivo a realização de atividades e trabalhos em grupo, onde todos participem e dialoguem.
Mapeamento do conhecimento coletivo
Para se preparar os saberes que serão dialogados é importante conhecer os saberes que os estudantes já possuem sobre algum assunto a ser debatido, com intuito de se perceber o nível de consciência e desenvolvimento que os jovens estão. Com esse mapeamento as atividades a serem preparadas se tornam mais coerentes, com base na realidade dos jovens e no conhecimento que eles já possuem acerca dos assuntos a serem dialogados.
Apresentar o período histórico e localização de cada pensamento
Percebi o quanto é importante quando apresentar o pensamento de um filósofo, apontar também a época histórica e o país de origem do mesmo, para que se possa permitir ao estudante a percepção da diferença de pensamento ao passar dos tempos, inclusive a diferença de pensamento entre os diferentes países.
Apresentar filósofos e pensadores brasileiros
Mostrar que o brasil também produz conhecimento dito filosófico, incluindo filósofos e pensadores brasileiros nas discussões e nos diálogos, assim como com textos didáticos.
Dialogar assuntos da realidade cotidiana dos jovens
Associar as reflexões filosóficas com a realidade que os jovens vivenciam, convidando eles a questionar os valores e crenças transmitidas pelo “senso comum” e pela “cultura de massa”. Trazer assuntos pertinentes a serem debatidos, relacionados com as matérias e disciplinas lecionadas. Incentivar aos jovens a reflexão sobre o conhecimento e as experiências do cotidiano, a ver o mundo de uma maneira mais ampla, como diz Merleau-Ponty “a verdadeira filosofia é reaprender a ver o mundo”.
Equilibrar história, temas e debates livres
Tentar não deixar as aulas muito pesadas, equilibrando entre transmissão de conhecimentos da história da filosofia, apresentação de temas filosóficos e abertura de diálogos para debates livres.
Uso de frases filosóficas e questionamentos
Tenho percebido como positivo o uso de frases filosóficas para exemplificação nas atividades educativas, inclusive o uso de questionamentos, para incentivar os estudantes a se questionarem. Acredito que a disposição de frases e questionamentos durante a atividade educativa pode gerar nos estudantes o contato com reflexões e questões pertinentes. Questionar o que eles pensam sobre as coisas, ou o que eles acham que pensam.
Rever a arquitetura da sala de aula
Importante a possibilidade de se repensar e alterar o espaço físico da sala de aula, dispondo as carteiras em círculo, ou em pequenos grupos, ou outros formatos diversos, para aos poucos desconstruir o padrão da aula em fila indiana, a tradição autoritária que o jovem já não suporta, possui grande aversão e desinteresse.
Refletir sobre a prática educativa e a função da filosofia
De tempos em tempos refletir sobre a prática educativa, o que está sendo feito, o que foi positivo o que não foi positivo, o que está indo bem, o que não está. E refletir sobre a função da filosofia na vida dos jovens.
Pouso Alegre, 01 de março de 2013.
Bruno Barbedo Carrasco.
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