• Diferenças entre os modelos propostos e realidade concreta - a prática da pedagogia tradicional se distancia da realidade cotidiana dos alunos;
• Anacronismo: preparam o aluno para um mundo que já não existe mais – falta de sentido histórico (de mudanças sociais e econômicas);
• O professor se coloca no papel de mestre, que dita as regras do que é certo (para ele), gerando alunos quietos, obedientes, submissos e facilmente teleguiados;
• A pedagogia tradicional serve a formar e institucionalizar pessoas, não permite que elas desenvolvam suas capacidades de maneira integral, ética e libertadora, enquadrando e transformando-os em seres alheios de si mesmos;
• Esta prática serve a uma economia que busca formatar o ser humano de acordo com as necessidades e exigências de mercado de produção e consumo, os professores reproduzem a ideologia a favor da manutenção do status quo;
• O capitalismo é ensinado como bom e libertário, mas sua prática é controladora, exclusora e alienante - os modos de ser, viver e os gostos da burguesia são ensinados como os únicos verdadeiros e corretos – as diferenças de valores por conseqüência das diferenças econômicas são ignorados;
• O ser humano, que é um ser que possui sua realidade particular, suas vivências, seus conhecimentos, sua cultura, sua história e seus valores, é negado, sendo transformado num ser de horários, tarefas e leituras – sendo desapropriado de si mesmo e alienado;
• Valoriza a quantidade de conhecimento memorizado e não a qualidade do que é realmente absorvido e vivenciado, enfim, faz-se demagogia.
Pontuações para uma prática ética e libertadora:
• Reconhecer que não há neutralidade na prática educacional, portanto há que se tenha uma escolha ética e política, pois o trabalho educativo é um ato político e ético com conduta, compromisso e postura;
• Ter curiosidade para aprender e ousadia para se lançar ao novo;
• Realizar o processo educativo numa convivência, no exercício da relação entre o conteúdo a ser ensinado e a experiência social, cultural e os anseios de cada um;
• O trabalho educativo não deve ser feito partindo dos valores morais e preferências culturais de quem ensina, isso pode ser sugerido como possibilidade, mas não como unica possibilidade, reconhecendo que o outro é diferente de mim e que também possui valores e cultura para dialogar;
• Perceber as diferenças entre o educador e o educando (cultural, social, econômica, histórica, afetiva, subjetiva, etc.) – romper com práticas anacrônicas e costumes autoritários cristalizados culturalmente;
• Reconhecer a educação como experiência criadora, onde o aprender é uma experiência de quem cria e não de quem é teleguiado - agindo contra o autoritarismo para a desconcentração do poder;
• Ensinar e aprender num clima de boniteza e alegria, numa relação amistosa, havendo liberdade com limites éticos, e construindo autonomia com responsabilidade;
• Há que seja coerente e sincero com o que diz, integrando prática e teoria para a transformação;
• Lembrar sempre que “o professor aprende ao ensinar e o aluno ensina ao aprender” (Paulo Freire);
• A apreensão do conhecimento é construída coletivamente, a partir da análise das contradições vivenciadas na realidade local;
• A concepção educacional libertadora rompe com as tradições autoritariamente preestabelecidas para a construção de um sujeito crítico que supera os obstáculos ideológicos de tradição sociocultural do colonizador, predispondo-se à análise da realidade imediata em que a comunidade se insere, participando ativamente, tomando decisões e arquitetando os fazeres transformadores a ela pertinentes - a tomada de consciência das implicações políticas da prática sociocultural tradicional e a construção de um novo paradigma e sua respectiva implementação crítica;
• A educação popular emancipatória: aposta-se na autonomia comunitária, enquanto gestão de seus próprios destinos, negando a ingerência de representantes assistencialistas da elite intelectual ou econômica que definem uma homogenidade irreal e injusta, fazendo da prática sociocultural popular uma mera reprodução das tradições culturais ideologicamente concebidas e implementadas por essas elites dominantes para perpetuar a desinformação e a desigualdade social. (Antônio F. Gouvêa da Silva).
Etapas para a construção do saber de maneira autônoma:
• 1º perceber a Alienação no trabalho educacional através da interferência da ideologia de mercado sobre a nossa vida e da teoria sobre a prática;
• 2º reconhecer as deficiências do método pedagógico tradicional;
• 3º lançar-se para uma nova prática, estabelecer novos e diferentes vínculos e relações educacionais; recriar o espaço de ensino a maneira de se realiza-lo;
• Agir de forma Dialética = relação, movimento, troca, diálogo, dar e receber;
• O respeito à autonomia, à liberdade e à dignidade de cada um;
• As relações entre professores e alunos são únicas e suas opiniões morais, seus valores e seus desejos nem sempre convergem – eles são dois seres diferentes;
• Diferenças entre trabalhos concretos (prático, vivencial) e trabalhos ideais (teórico);
• Não se manter na teoria e valorizar a prática da construção do saber em conjunto;
• O trabalho educativo deve servir a nós mesmos e não a paradigmas, instituições ou regras morais – este se realiza em movimento, aberto para idéias, sugestões e críticas;
• O professor muitas vezes reproduz valores e ideologia burguesa, ignorando o aluno, distanciado das necessidades concretas para servir aos valores de uma classe opressora;
• Ideologia burguesa = agir, sentir, pensar à favor de uma classe social burguesa
• Alienação = alhear, distanciar-se de si, descontextualizar-se e deshistorizar-se; os desejos não são mais próprios, mas alheios: sentimentos alheios, normas alheias, pensamentos alheios e, por fim, existência alheia;
• Cabe ao educador (professor), em sala de aula, que seja o mesmo ser que é fora do recinto escolar: deve haver uma correspondência ética com relação ao que se é - não se trata de estar num ambiente para servir a papéis sociais (máscara, figura que não se corresponde ao que se é), mas sim um ser que está vivenciando; para que o aluno também seja o mesmo ser fora da escola – para isso, é necessário se levar em consideração a realidade e a pessoa de cada um, e não se tratar por meio de papéis que servem à um sistema pedagógico tradicional que nega as reais vivências e a particularidade da história subjetiva e sócio-econômica-cultural de cada ser.
Diferenças entre a Pedagogia Tradicional e a Proposta Dialética:
Diferenças de pontos de vista de onde partem a proposta tradicional e a dialética:
- Aluno: espectador X participante;
- Educar: formar X transformar;
- Aula: direcionar X diálogo;
- Relação: máquinas X pessoas;
- Tratamento: superioridade X igualdade;
- Valorização: ordem (“certo”) X liberdade (criativo, lúdico);
- Escola: ambiente burguês X espaço do educando e educador;
- Ensino: teórico X construtivo, prático.
Outros conceitos e práticas relacionadas:
• Pedagogia da Autonomia: produção da existência humana digna, justa e solidária - representa o encontro ético entre o ensinar e o aprender; leitura crítica do mundo; um compromisso educativo que faz de cada intervenção e transformação um passo para a liberdade;
• Práticas educativas emancipatórias: através duma revisão teórica e prática da caminhada educativa pessoal e grupal, numa jornada em coerência entre o pensar, o sentir, o agir e o transformar; avaliando nossas práticas educativas e transformando-as na construção de uma prática substantivamente democrática;
• Ninguém é autônomo primeiro para depois decidir – a gente vai amadurecendo todo dia ou não; é um processo de ser para si, de vir a ser;
• Assumir responsável: nossa opção de vida, nossas decisões, nosso modo de aprender e ensinar, nosso jeito de pensar, de sentir, de dizer e agir;
• Respeitar os saberes dos educandos com criticidade, estética e ética; e manter rejeição a qualquer forma de discriminação, para tanto é necessário uma reflexão crítica sobre a prática, com reconhecimento da identidade cultural;
• Ensinar não é transferir conhecimento: ensinar exige consciência do inacabamento, convicção de que a mudança é possível;
• Reconhecer a educação como produtora da existência humana, como forma de intervenção no mundo.
(Targélia de Souza Albuquerque)
Citações e referêncais de diversos autores:
• A ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sentir e como devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer. Ela é, portanto, um corpo explicativo (representações) e prático (normas, regras, preceitos) de caráter prescritivo, normativo, regulador, cuja função é dar aos membros de uma sociedade dividida em classes uma explicação racional para as diferenças sociais, políticas e culturais, sem jamais atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes, a partir das divisões na esfera da produção. (Marilena Chauí)
• O homem está alienado quando deixa de ser seu próprio objeto para se tornar objeto de outro. Deixa de ser algo para si mesmo. Sua vontade é assim a vontade de outro: ele é coisificado. Deixa de ser homem, criatura consciente e capaz de tomar decisões, para se tornar coisa, objeto;
• Homens e mulheres que vão para o trabalho, no qual empenham sua própria vida para gozo de outros; jovens que vão para a guerra para serem mortos, sabendo que vão morrer, até com certa satisfação, acreditando que vão defender a civilização ocidental e cristã. E homens que se prestam ao papel de ensinar aos jovens que tudo isso é muito certo e muito justo. (Juvenal Basbaum)
• A inteligência é a função que só se "ativa" diante de uma situação-problema. Ora, todo processo escolar que não "desafia" é frenagem ao desenvolvimento desta função. A escola tem representado até aqui um "complot" contra a livre pesquisa intelectual, fornecendo fórmulas já acabadas que robotizam a solução dos problemas. Difícil é encontrar um professor que não julgue ser seu papel "facilitar as coisas para o aluno". (...) O professor não ensina, ajuda o aluno a aprender. Hoje está suficientemente comprovado que o desafio é o processo didático para o desenvolvimento intelectual. Ensinar é apenas desafiar, adequada e gradualmente. A memorização é o correspondente verbal do condicionamento da motricidade: ver Skinner (EUA) e Pavlov (URSS). Ora, o condicionamento é processo arcaico (animal e infantil) de estruturação da experiência (anterior mesmo à qualquer estrutura de caráter simbólico) (...)
• O diploma supõe a existência de um 'corpo de conhecimento' estático. Como se sabe, é cada vez menor o período em que todos os conhecimentos são substituídos. O fenômeno de substituição atinge, inclusive, as profissões, que desaparecem e nascem, diariamente. Se os 'ciclos de conhecimento' são cada vez mais rápidos, não se justifica o diploma. A expressão 'reciclagem' é típica da mudança permanente de know-how: os profissionais precisam, anualmente, sofrer revisão em seu tirocínio, sob pena de sua tecnologia obsolescer. Acelerando-se o processo, chegamos à 'educação permanente', incompatível com o diploma. (...) Ora, sem diplomas não há escolas... pelo menos o tipo de escola com que nos acostumamos nos últimos séculos. A escola até hoje só se justificou pelas regalias que traz aos portadores de seus diplomas, uma espécie de 'carta régia' que concede privilégios a seus portadores. (Lauro de Oliveira Lima)
• Assim, quando são necessários guerreiros ou burocratas, a educação é um dos meios de que os homens lançam mão para criar guerreiros ou burocratas. Ela ajuda a pensar tipos de homens. Mais do que isso, ela ajuda a criá-los, através de passar de uns para os outros o saber que os constitui e legitima. Mais ainda, a educação participa do processo de produção de crenças e idéias, de qualificações e especialidades que envolvem as trocas de símbolos, bens e poderes que, em conjunto constroem tipos de sociedades;
• (...) o educador imagina que serve ao saber e a quem ensina mas, na verdade, ele pode estar servindo a quem o constitui professor, a fim de usá-lo, e ao seu trabalho, para os usos escusos que ocultam também na educação – nas suas agências, suas práticas e nas idéias que ela professa – interesses políticos impostos sobre ela e, através de seu exercício, à sociedade que habita. E esta é a sua fraqueza. (Carlos R. Brandão)
• Nossas escolas são construídas segundo o modelo das linhas de montagem. Escolas são fábricas organizadas para a produção de unidades biopsicológicas móveis, portadoras de conhecimentos e habilidades. Esses conhecimentos e habilidades são definidos exteriormente por agências governamentais a que se conferiu autoridade para isso. Os modelos estabelecidos por tais agências são obrigatórios, e têm a força de leis. Unidades biopsicológicas móveis que, ao final do processo, não estejam de acordo com tais modelos são descartadas. É a sua igualdade que atesta a qualidade do processo. Não havendo passado no teste de qualidade-igualdade, elas não recebem os certificados de excelência ISSO-12.000, vulgarmente denominados diplomas. As unidades biopsicológicas móveis são aquilo que vulgarmente recebe o nome de “alunos”. (Rubem Alves)
• Há um ditado chinês que diz que, se dois homens vêm andando por uma estrada, cada um carregando um pão, e, ao se encontrarem, eles trocam os pães, cada homem vai embora com um; porém, se dois homens vêm andando por uma estrada, cada um carregando uma idéia, e, ao se encontrarem, eles trocam as idéias, cada homem vai embora com duas. (Mário Sérgio Cortella)
Bibliografia de Referência
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ARANHA, Maria Lúcia de A. & MARTINS, Maria Helena P. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1993.
ARDUINI, Juvenal. Homem Libertação. São Paulo: Paulinas, 1975
BASBAUM, Leôncio. Alienação e Humanismo. São Paulo: Global, 1982.
BOCK, Ana M. Bahia, GONÇALVES, M. Graça M., FURTADO, Odair (orgs.). Psicologia Sócio-Histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. São Paulo: Cortez, 2001.
BRANDÃO, Carlos R. O que é Educação. São Paulo: Brasiliense, 2004.
CARRASCO, Bruno B. A Conscientização da Alienação na Escola como Contribuição à Psicologia Educacional: 2005. Trabalho de Conclusão de Curso – Curso de Psicologia, Universidade do Vale do Sapucaí, Pouso Alegre, 2005.
CHAUÍ, Marilena S. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense, 1988.
CHAUI, Marilena S. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1995.
CODO, Wanderley. O Que é Alienação. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986.
CORTELLA, Mário Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. 3 ed. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2000.
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FERREIRA, May Guimarães. Psicologia Educacional e Análise Crítica. São Paulo: Cortez, 1986.
FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
FURTER, Pierre. Educação e Reflexão. Petrópolis: Vozes, 1976.
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MARAFON, Maria Rosa C. Pedagogia Crítica. Petrópolis: Vozes, 2001.
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SOUZA, Ana Inês. A Pedagogia de Paulo Freire. Curitiba: CEFURIA, 2006.
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Bruno Barbedo Carrasco, 2007.
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